Da janelinha do avião

Janelinha

Janelinha do aviao

Sem saber mais onde gastar toda dinheirama, dinheiro a rodo embolorando na poupança, resolvi torrar grana viajando de avião pelo mundo afora. Só tirava passagem com direito à janelinha, caso contrário, neca. Assim fui, cortando os ares, vendo a terra de riba pra baixo. Eu no céu e a terra exibindo-se, panoramicamente pra mim, como se eu fosse um ministro do todo venturoso.

Estupefato fiquei quando o brilho da aurora tingiu o céu e a terra com suas cores de fogo. O espetáculo estupefaciente fazia sentir-me o escolhido, pelo privilégio de contemplar Deus se despertando para um novo dia.

Eu, literalmente nas nuvens, horas a fio cruzando os céus, rasgando o espaço, sobrevoando terra, rios, mares.
Quando a luz crepuscular varreu o breu da noite, tudo ficou nítido.
Do alto observava que as montanhas forçavam os rios a serpenterem-se ao longo de sua extensão em busca do caminho de menor resistência, não se importando em dar longas volta para chegar ao seu destino.

Via-se também, da janelinha do avião, a estupidez do homem refletida no filete de cinco metros de mata às margens dos rios ao longo de toda sua extensão em cumprimento APPs
que, se não fosse o hipócrita decreto do Código Florestal, nem esses 5 metros existiriam.
Horas a fio cruzado Goiás e Mato Grosso e tinha-se a impressão que o planeta tinha ficado careca. Mata, só existiam esses hipócritas cinco metros às margens dos rios, o resto era lavoura, pastos e áreas preparadas para lavoura e pastos.

A usura, tão condenada nos livros sagrados, atingiu seu ápice na agricultura brasileira, cegou o homem a ponto deste esquecer a importância dos rios, o valor da água.
Os rios, que minhas professoras de geografia diziam ser água potável, límpida e cristalina, do alto, via-se marrom, próximos da cidade; negros.

De tanto contorcer-me para espiar o planeta pela janelinha do avião o espinhaço começou a arder e quando o voador que me conduzia saiu da luz branca do entardecer e adentrou na linha preta do anoitecer eu bati a persiana da janelinha e passei a observar o que acontecia dentro do avião.

De dentro do avião eu fitava as moças bonitas empetecadas, com o cabelo num laquê lascado que podia passar o Furacão Matthew que não conseguia mover sequer um fio.

Da minha poltrona, mais apertada que fim de mês eu ficava pensando: onde os fabricantes encontravam os trouxas para testarem os aviões para saber se o troço é ou não confiável. No meio da pensação eu entrei em pânico quando o avião se transformara numa Novo Horizonte, mas logo apareceu uma moça bonita pra dizer o avião enfrentava uma tal turbulência.

E eu naquele apertume danado, espremido na poltrona ficava imaginado a alegria de meus netos se pudessem pegar todos aqueles algodões-doces que passavam diante da janelinha do avião.

Após forrar a pança com o lanche mais aziático que cuscuz com ovo, oferecidos pelas moças bonitas do avião e, sem ter nenhum fumante para infernizar a vida da gente, acabei pegando no sono.

Quando o ônibus que voa fritou os pneus na pista e o motorista ragou-lhe uma primeira reduzida fazendo o motor troar e diminuir a embalagem do bicho, eu acordei.

About José William Vieira

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Brasileiro da Bahia que gosta de escrever. Escritor/Jornalista que gosta de abordar o cotidiano do seu ângulo de visão.

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