A crise política se desenvolve em duas camadas bem distintas. Numa, a da percepção dos gover- nistas, parece que certas fichas só caíram esta semana. Foi algo como a combinação do resultado das pesquisas eleitorais (que a bem da verdade não trazem nenhuma grande novidade, só a inexorável decadência da avaliação do governo); da mais recente derrota em votação na câmara; da nova prisão de José Dirceu, desta vez sob a certeza de que houve enriquecimento pessoal (o que meio que tanto faz para quem repudia a corrupção, mas que para o psiquismo petista significa uma traição); e um lampejo tardio de consciência quanto ao tamanho da encrenca.
Na camada de quem detém os fiozinhos do poder real, no entanto, os sintomas são de que está adiantada a costura de um acordo em torno da figura do vice-presidente Michel Temer. Os sinais são interessantes. Na quarta-feira, Temer fez um apelo emocionado (parecia estar emocionado mesmo) pela união em torno de “alguém” com liderança política para superar as crises – como quem diz “estou aqui pra isso”. No dia seguinte, a Fierj e a Fiesp, federações da indústria de São Paulo e Rio,responderam com nota em apoio a Temer – e sem citar Dilma.
Também chamou a atenção o editorial do jornal O Globo, na sexta feira, que além de endossar o apelo de Temer ainda ataca o presidente da câmara Eduardo Cunha, em sua “guerra particular” contra o PT. O editorial conclui pedindo “condições de governabilidade para o planalto”… mas não cita Dilma na frase. Não creio que esse seja um detalhe de redação. A operação de separar o PMDB de Temer e o PMDB de Cunha é bastante sintomática. Houve petistas que respiraram aliviados, mas parece ser o caso contrário.
Somou-se a isso o artigo do New York Times, no mesmo dia, apresentando Temer para o mundo(foto). Também a capa da Folha de São Paulo que, como nota uma amiga minha, traz foto do vice de baixo para cima, emoldurado pelas palavras “governabilidade e governança” (enquanto a manchete fala do novo panelaço provocado pelo programa do PT na quinta). E ainda a estranha edição do Jornal Nacional da Globo, que mostrou uma longa fala de Dilma, dizendo que resistirá às pressões e sendo aplaudida, e concluindo com uma matéria sobre o aeroporto de Cláudio, Minas Gerais, uma das principais acusações contra Aécio.
Essa seria uma edição “petista” – se essa fala de Dilma não servisse para acirrar as convocações para as manifestações contra Dilma no dia 16, e a menção ao aeroporto não sinalizasse que a ala aecista do PSDB está a ponto de sofrer uma derrota, com a composição entre Temer e as alas de Alckmin e Serra do PSDB. De fato, Serra está negociando para assumir o ministério da fazenda em um possível governo Temer. E Alckmin é contrário à tese de novas eleições imediatas, das quais em tese Aécio se beneficiaria, por causa do recall da eleição anterior.
As novas eleições só ocorreriam se a chapa Dilma-Temer fosse impugnada pelo TSE, por irregularidade eleitoral (as propinas das empreiteiras entrando como doação de campanha). Mas isso jogaria a presidência durante algum tempo na mão do terceiro na linha sucessória – que até segunda ordem é Eduardo Cunha. Um caminho mais suave para o impeachment será o do julgamento das chamadas “pedaladas” fiscais pelo TCU, o Tribunal de Contas da União, que só atingirá Dilma. Evidentemente esses processos são muito mais políticos do que técnicos, ainda que precisem respeitar certos limites.
Se havia incerteza quanto ao rumo a tomar no caos da crise, a possibilidade esboçada esta semana de um acordo entre o PMDB “responsável” de Temer e o PSDB de Alckmin e Serra, escanteando Cunha e Aécio, e aproveitando a agonia do PT, parece ter sido aproveitada com rapidez. São esses os sinais emitidos pela grande mídia, e pelo capital. Mesmo a ameaça de um Lula forte em 2018 pode ser neutralizada com as investigações do Petrolão: basta Leo Pinheiro da OAS e/ou Marcelo Odebrecht abrirem a boca para incriminarem diretamente o ex presidente. Ambos já consideram a hipótese (Odebrecht vai iniciar negociações); um processo de impeachment sepultará de vez qualquer estratégia de blindar o PT.
Em março publiquei o texto Talvez a defesa da democracia dependa de derrubar Dilma, em que procurei desenvolver dois temas: a incapacidade congênita do segundo governo Dilma de escapar às armadilhas da combinação das crises política, econômica e policial, e a tendência da presidente em assumir o
A crise política se desenvolve em duas camadas bem distintas. Numa, a da percepção dos gover- nistas, parece que certas fichas só caíram esta semana. Foi algo como a combinação do resultado das pesquisas eleitorais (que a bem da verdade não trazem nenhuma grande novidade, só a inexorável decadência da avaliação do governo); da mais recente derrota em votação na câmara; da nova prisão de José Dirceu, desta vez sob a certeza de que houve enriquecimento pessoal (o que meio que tanto faz para quem repudia a corrupção, mas que para o psiquismo petista significa uma traição); e um lampejo tardio de consciência quanto ao tamanho da encrenca.
Na camada de quem detém os fiozinhos do poder real, no entanto, os sintomas são de que está adiantada a costura de um acordo em torno da figura do vice-presidente Michel Temer. Os sinais são interessantes. Na quarta-feira, Temer fez um apelo emocionado (parecia estar emocionado mesmo) pela união em torno de “alguém” com liderança política para superar as crises – como quem diz “estou aqui pra isso”. No dia seguinte, a Fierj e a Fiesp, federações da indústria de São Paulo e Rio,responderam com nota em apoio a Temer – e sem citar Dilma.
Também chamou a atenção o editorial do jornal O Globo, na sexta feira, que além de endossar o apelo de Temer ainda ataca o presidente da câmara Eduardo Cunha, em sua “guerra particular” contra o PT. O editorial conclui pedindo “condições de governabilidade para o planalto”… mas não cita Dilma na frase. Não creio que esse seja um detalhe de redação. A operação de separar o PMDB de Temer e o PMDB de Cunha é bastante sintomática. Houve petistas que respiraram aliviados, mas parece ser o caso contrário.
Somou-se a isso o artigo do New York Times, no mesmo dia, apresentando Temer para o mundo(foto). Também a capa da Folha de São Paulo que, como nota uma amiga minha, traz foto do vice de baixo para cima, emoldurado pelas palavras “governabilidade e governança” (enquanto a manchete fala do novo panelaço provocado pelo programa do PT na quinta). E ainda a estranha edição do Jornal Nacional da Globo, que mostrou uma longa fala de Dilma, dizendo que resistirá às pressões e sendo aplaudida, e concluindo com uma matéria sobre o aeroporto de Cláudio, Minas Gerais, uma das principais acusações contra Aécio.
Essa seria uma edição “petista” – se essa fala de Dilma não servisse para acirrar as convocações para as manifestações contra Dilma no dia 16, e a menção ao aeroporto não sinalizasse que a ala aecista do PSDB está a ponto de sofrer uma derrota, com a composição entre Temer e as alas de Alckmin e Serra do PSDB. De fato, Serra está negociando para assumir o ministério da fazenda em um possível governo Temer. E Alckmin é contrário à tese de novas eleições imediatas, das quais em tese Aécio se beneficiaria, por causa do recall da eleição anterior.
As novas eleições só ocorreriam se a chapa Dilma-Temer fosse impugnada pelo TSE, por irregularidade eleitoral (as propinas das empreiteiras entrando como doação de campanha). Mas isso jogaria a presidência durante algum tempo na mão do terceiro na linha sucessória – que até segunda ordem é Eduardo Cunha. Um caminho mais suave para o impeachment será o do julgamento das chamadas “pedaladas” fiscais pelo TCU, o Tribunal de Contas da União, que só atingirá Dilma. Evidentemente esses processos são muito mais políticos do que técnicos, ainda que precisem respeitar certos limites.
Se havia incerteza quanto ao rumo a tomar no caos da crise, a possibilidade esboçada esta semana de um acordo entre o PMDB “responsável” de Temer e o PSDB de Alckmin e Serra, escanteando Cunha e Aécio, e aproveitando a agonia do PT, parece ter sido aproveitada com rapidez. São esses os sinais emitidos pela grande mídia, e pelo capital. Mesmo a ameaça de um Lula forte em 2018 pode ser neutralizada com as investigações do Petrolão: basta Leo Pinheiro da OAS e/ou Marcelo Odebrecht abrirem a boca para incriminarem diretamente o ex presidente. Ambos já consideram a hipótese (Odebrecht vai iniciar negociações); um processo de impeachment sepultará de vez qualquer estratégia de blindar o PT.
Em março publiquei o texto Talvez a defesa da democracia dependa de derrubar Dilma, em que procurei desenvolver dois temas: a incapacidade congênita do segundo governo Dilma de escapar às armadilhas da combinação das crises política, econômica e policial, e a tendência da presidente em assumir o papel do “bode sacrificial”. De lá para cá, os piores prognósticos só se confirmaram. Cada vez que insiste em que resistirá, Dilma só consegue reforçar o lado contrário.
Não que Dilma seja necessariamente culpada da corrupção; até acredito que não é (ainda que sua inabilidade, e a de seu grupo mais próximo, potencialize de maneira absurda a discórdia). Acontece que a crise chegou a um ponto em que o país como um todo está sendo prejudicado, em que tanto os interesses dos trabalhadores quanto os do capital estão sendo postos em risco severo. As pesquisas (e o avanço das inverstigações) apontam que Dilma e o PT são os melhores, ou os primeiros, candidatos a pagar pelo pato. Mas de repente as pecinhas do jogo se colocaram em posição tal que é possivel se livrar não só de Dilma, mas de Eduardo Cunha e até de Aécio, os principais apostadores na radicalização da confusão. Tudo indica que é Temer que vem aí.
papel do “bode sacrificial”. De lá para cá, os piores prognósticos só se confirmaram. Cada vez que insiste em que resistirá, Dilma só consegue reforçar o lado contrário.
Não que Dilma seja necessariamente culpada da corrupção; até acredito que não é (ainda que sua inabilidade, e a de seu grupo mais próximo, potencialize de maneira absurda a discórdia). Acontece que a crise chegou a um ponto em que o país como um todo está sendo prejudicado, em que tanto os interesses dos trabalhadores quanto os do capital estão sendo postos em risco severo. As pesquisas (e o avanço das inverstigações) apontam que Dilma e o PT são os melhores, ou os primeiros, candidatos a pagar pelo pato. Mas de repente as pecinhas do jogo se colocaram em posição tal que é possivel se livrar não só de Dilma, mas de Eduardo Cunha e até de Aécio, os principais apostadores na radicalização da confusão. Tudo indica que é Temer que vem aí.
Fonte: https://br.noticias.yahoo.com/blogs/alex-antunes/temer-vem-a%C3%AD-065157521.html